Tenho desejo de um cigarro. Aliás, quero um cigarro; sentir
a sua fragilidade; vê-lo a consumir-se, enquanto me consome, e estender o olhar
afeado por esta miragem citadina; tomar o seu paladar infimamente e
particularizar o seu esvair precoce entre a sensação dos dedos. Deixar-me
abrangido pela quentura das paredes e emocionar-me com o cair da chuva. Debruçar
o meu corpo sobre o vago (cigarro ardente), sentir a leveza das partículas, atraiçoar
o pensamento, trair o destino, apunhalar a vida!
Fumar mata? E viver? Viver também não é mortal (confusão) –
dilema?! Oh, como é constrangedor estar vivo.
Sou um louco insanável que se tenta preencher por uma razão,
que jamais será absoluta, pelo seu próprio conceito ser privado e relativo.
Experimento a combustão do corpo, a química capaz de nutrir
os poros, de dar gesto ao homem – expressão. Se ao menos tudo fosse exacto e
não houvesse este luar perfumado de Outono. Se pelo menos fosse poeta e tivesse
a capacidade de me enjugar neste papel e ver-me esvaído de mim. A minha
complexidade cansa-me de verdade, enquanto o cigarro se dissipa…
Apago o cigarro.
Deito-me.
Finjo que não respiro.