Não, não me apetece exactamente nada. Hoje limitar-me-ei a
ficar com os pés pousados na janela e a despejar palavras (algumas talvez sem
nexo aparente). Ficarei apenas a absorver a solidão e a contemplar o cansaço. Sentirei
as pernas dormentes, mas hoje prometo que ficarei assim – sem movimentos constrangedores.
Tentarei não ser atraiçoado pelos pulmões, que podem eventualmente deixar de aspirar
ar. Serei, rigorosamente, sim, rigorosamente, uma máquina. E nada mais me
perturbará que o barulho, barulhento da máquina. Não haverá cedências para
pensamentos (“pensar é não entender”), deixando-me exclusivamente ao
rotativismo de uma máquina, da minha máquina e à corrente eléctrica que esvaia
pelo meu físico e que dá tonalidade a este subscrito.
Desejo de tudo isto o infinito, e que o telemóvel se limite
à sua insignificância, e que nada, mas mesmo nada, me faça desviar-se de mim. Isto
porque todas as máquinas trabalham sozinhas, sendo eu incrivelmente uma
máquina.
Escorre-me dor pelas costas; apetece-me ficar nu, como a
cabra humanidade me trouxe, talvez pelas cegonhas que vejo ao largo olhar. Usufruo
desta dor e absorvo-a como reflexão. Não ouso sequer estender a mão para um
cigarro, ou tirar o isqueiro de fogo, garanti que ficaria assim até que a vida
me queira viver, ou que eu suporte vivê-la.
Apetece-me indiscutivelmente banhar-me em lágrimas, mas este
insuportável cansaço inunda-me interiormente e, com um egoísmo mecânico
profundo, nem me põem água na retina.
Inspiro dor, tudo o que há em mim é puramente dor, gotejo
dor, dor ancestral.
Prometi que não pensaria; se pensaram que pensei, não me
digam… deixem-se a sós com a dor, precisamos de conversar…
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