quarta-feira, 29 de maio de 2013

Porque Nem Todos os Caminhos Vão Dar Roma

Labirintos sinistros perturbam o caminho dos que caminham para Roma. À distante mirada, Roma é logo aqui (tão longe) naquele país que serve de bota à Europa; que nem todos conseguem fazer entrar para prosseguir caminho.
Roma, cidade perfumada pela H(h)istória,  é o destino pontífice de todos os seres, humanos, mortais. Ela, aqui tão perto e tão longe, faz brilhar nos contornos destes caminhos os seus entretantos.

Hoje, quando te olho, Roma, nenhuma beleza poderá ser compara a ti, nem as duas vizinhas Florença e Veneza! Porque tu és o caminho do bom porto, o cintilante de todas emoções, mesmo quando adormeço e vejo (e ainda que todos os dias) que tu não estás lá, que continuas além, distante demais; quando sorrio, quando o meu olhar te ignora, quando me finjo desinteressado ou mesmo distraído, até quando solto esta ou aquela lágrima, lembra-te que é por ti que lamento, porque todos as vezes e mais algumas, me mostras os pórticos de algo que jamais será meu…
A cada manhã e até mesmo quando acordo de noite, vislumbro essa vela, termómetro de emoções que enlouquece e deixa para amanhã, tudo aquilo que poderia ser hoje, neste preciso instante. Mesmo quando a contemplo apagada eu sinto a cada instante o renascer de todos as sensações. O calor que me afoga e o frio da espinha que me aperta.
És longe em diferente medida do que és longa, porque, se porventura, os teus portões se abrirem serás a cidade mais explorada deste planeta, e ainda que tenhas outros visitantes te possuam, acredita que nenhum terá o misto de profundeza e sensibilidade que o meu toque , olhar ou até que cada troca de sensações olfactivas.

E se um dia, e tendo em conta todo este atalho de jardins que me dividem de ti, chegar a Roma, quero pernoitar aí todas as minhas noites, por todas as estações do ano, sendo que no fim não restará espaço para o vazio – eterno, eternamente! Senão chegar, dado que nem todos os caminhos vão dar a Roma, podes perfeitamente refugiares-te na tua cela de grades. Mas lembraste-ás que eu existi, que eu caminhei, mesmo que sombriamente, para o teu regaço, para o teu recanto intemporal.       


segunda-feira, 29 de abril de 2013

Dormi Contigo


Olho para cama e toda ela me parece conforto, quem sabe talvez a única capaz de consolar. Vejo-me no repasto dos seus lençóis, com a almofada a enxugar-me o cabelo e todos as minhas frustrações. Creio que só assim conseguirei pensar-me, ou mesmo esquecer-me.
Olho para a cama e, para mim, ela é um todo imóvel, não fala, ouve somente, quanto mais que não cochichará de nada sobre o quanto lhe tenho para dizer… Estará sempre ali, intacta, para mim, qualquer que seja a minha condição. Pode até não ter lençóis, sendo que ainda despida acolher-me-á.
Olho para cama e toda ela é uma abertura para o mundo próprio, onde esse mesmo mundo me desconhece e se perde.
Olho para a cama e toda ela é para mim o que preciso – o mais difícil e o mais profundo – paz!


Imaginação Inflamada


Sopro; foi este ápice que se ergueu, nesta noite, ao luar. De nada tinha de característica física, aliás trazia no seu regaço qualquer coisa de químico, de não material. Ascendia consigo a leveza sedutora do perfume imperceptível. No entretanto, o destino balança entre o ser, o estar e o fazer acontecer. É constrangedor a necessidade de reunião destes conceitos tão adversos… primeiro porque é preciso estar, e nesse instante ser-se (sendo isto a transformação do físico, que advém da presença corporal, para o estado de comparência mental) e eis que fazemos acontecer! O modo como o fazemos, a intensidade que lhe damos, ou mesmo a redundância com que percorremos, nada mais são que arestas deste prisma tricolor, ainda que muitas vezes na tentativa de dobrar o vértice para a aresta seguinte, para um novo auge do surgimento. É a tentativa da esperança máxima assim, como ao Inverno apetece a Primavera, ao Homem apetece a mudança.
Mais do que uma ambição é um sopro de uma imaginação inflamada…





segunda-feira, 22 de abril de 2013

Num País Chamado Terra


Houve, e ainda que em tempos, circunstâncias em que o álcool que me invadia o sangue era fonte, quase inesgotável, de partituras salpicadas de vidas. A dicotomia das palavras fluía com uma solvência natural e o seu real tacto era, inequivocamente, intocável!
Houve, em tempos, a necessidade de prenunciar esse laivos de palavras ao mundo, mas as forças tendiam em não tender para o papel, sendo que, inúmeras vezes, desconhecia a sua existência, a sua localização, o seu real valor. (Estava nos primórdios do coma).
Vivamente sóbrio, neste momento; minto(!): o sono apodera-se minuciosamente de mim. Enfrasco-me em água cristalina, na ânsia, frustrada, de conectar com essas entidades divinas do além, capazes, que sabe, de reconstruir todos os pigmentos que em tempos, como constatava, eram em mim toda uma realidade. 


terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

AcreditaR

Nasceu o despontar para a sina da vitória; invadiram-se as raízes para o crescimento intemporal das verduras; a luz perpétua solar fez-se resplandecente no clarão de Inverno; os sinos dobraram ao som da melodia do vento.
Fez-se vida em Terra: ACREDITAR!



quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Envelhec(s)er


Vamos escrever um Poema
Eu acho que não vamos escrever nada
Agora já não!
Como haveríamos de escrever?
Passaremos apenas os tentáculos pelo piano das palavras.
Oh! Como é constrangedor não ouvir o som deste piano
Que com tantos tentáculos podíamos polir
Todas as teclas, uma, por uma, a uma…
E poder averiguar a melodia da vida,
Na esperança de nos fundirmos aos seus acordes!
Mas apenas podemos dedilhar, passar o pincel
À deriva na tela virgem, por encontrar matiz
Para tal celeridade e decídua camada
Se a vida não valoriza tamanhas pretensões!
Ou seremos nós que a temos de estimar?
Ela passa e não nos roga;
Não nos alerta para o perigo!
De que a sua maior amante está a chegar.
A vida também é merecedora de comunhão…
O salvamento goteja-lhe pelos genes;
Por mais antagónica que esta seja.
Nada mais somos do que rudes figurantes,
Meros famintos de papéis principais
No teatro da vida onde a morte
Se assume heroína.
Cingimo-nos a testemunhas de boda,
Levando ao altar as alianças do acordo
E assistindo ao matrimónio que nos vai destronar.
Ficamo-nos pelo copo de água
Educadamente servis, fúteis e aparentemente relevantes.
No entretanto deste enlace, é a morte que nos aviva;
Sem ela a vida seria a melodia da tela – acordes de tom!
Arcando sem medo ou temor o cerco que nos coage
Retirando-nos o sabor de um ósculo com a vida.
Vida / morte: antagonistas ou condiscípulas? 


segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Filosofias Clandestinas


A morte caminha a passo lento. Pegajosa como o vento, limiar do veneno da aranha; infimamente particularizada pelas pegadas templárias do bombear do miocárdio. Nutrida pela tentação dos sentidos e pela maior arma da nossa espécie – cérebro! Ocupamos este habitáculo interiormente cansado de sustento de si mesmo, dizemos que é mundo. Nutridos pela escassez da moléstia vida humana, pelo incrédulo paladar tenebroso do existir, pela incapacidade do prolongar a espírito para além do limiar das células. Vivemos a cada momento alimentados pela morte, que apesar de caminhar a passo indefinido penetra algures pelas intersecções de ruas e vidas.
Envoltos neste indesvendável caminho, apressadamente, cautelosamente, com medo ou com ganância, mas caminhamos cegamente; enquanto isto, a morte espia!       

    

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Linhas Cruzadas


A vida encontra-se perfumada pelos instintos da sobrevivência humana. Aqui e ali, seguem-se caminhos, obtêm-se direcções e questionam-se escolhas. Há uma infinidade de emoções reluzentes para lá dos vitrais das portadas. Encontra-se nestes fragmentos de vivências humanas peças que se adequam, que se interlaçam, que se evidenciam do tamanho do seu querer. A brisa deixa debaixo do degrau do calçado a coragem do avançar. Os corpos vêm-se abraçados por esta combustão de emoções, pela inacreditável necessidade do possuir. Flagram fluídos e murmúrios da tentação do ajuntamento das almas, da partilha, dos afectos, da sensibilidade do toque, da perigosidade do olhar (ainda que há distância), escorrendo timidez sobre os ombros, apoiado na brusca necessidade da saudade.
Floresce nesta cair de Outono a necessidade uma Primavera ofegante e vigora tentadora para um próximo encontro. Na verdade temos linhas e segmentos diferentes, mas não duvidemos pois há linhas que se cruzam! 

  

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Porquê Direito?!


Creio que a minha vida assenta, essencialmente, no pensamento e na conduta humana. Seguindo esta ordem lógica de concepção o mais sensato seria ingressar num curso de Filosofia ou Teologia. Todavia, acredito que isso seria contributo decisivo para o meu suicídio mental, e, como tal, procurei algo mais concreto e exacto, onde não houvesse um lugar demasiado vago para a abstracção; uma fuga a pensamentos superiores, em suma!
Assim, aprendo a “avaliar” as acções das pessoas e a qualifica-las segundo normas preexistentes, de alguém, que, um dia, decidiu que os determinados actos/acções viam-se lacradas por actos/consequências.
Pessoalmente, ser aluno de Direito é enquadrar-me, é descer à terra, é tentar ser mais conciso e preciso.
Pensei, várias vezes, se esta seria a atitude mais sensata, se esta fuga seria a mais correcta. Hoje, passado sensivelmente um mês, creio que sim. Sinto-me apaixonado por tudo o que é mais concreto que eu (pelo antagonismo do meu ser). Todavia, fica entre a frincha da porta uma possibilidade para outros rumos, uma nova viagem… a luta (constante) pelo pensamento e pelas descobertas (nulas), porque sei que pensar é não perceber (concluir). 


A Dor da Máquina


Não, não me apetece exactamente nada. Hoje limitar-me-ei a ficar com os pés pousados na janela e a despejar palavras (algumas talvez sem nexo aparente). Ficarei apenas a absorver a solidão e a contemplar o cansaço. Sentirei as pernas dormentes, mas hoje prometo que ficarei assim – sem movimentos constrangedores. Tentarei não ser atraiçoado pelos pulmões, que podem eventualmente deixar de aspirar ar. Serei, rigorosamente, sim, rigorosamente, uma máquina. E nada mais me perturbará que o barulho, barulhento da máquina. Não haverá cedências para pensamentos (“pensar é não entender”), deixando-me exclusivamente ao rotativismo de uma máquina, da minha máquina e à corrente eléctrica que esvaia pelo meu físico e que dá tonalidade a este subscrito.
Desejo de tudo isto o infinito, e que o telemóvel se limite à sua insignificância, e que nada, mas mesmo nada, me faça desviar-se de mim. Isto porque todas as máquinas trabalham sozinhas, sendo eu incrivelmente uma máquina.
Escorre-me dor pelas costas; apetece-me ficar nu, como a cabra humanidade me trouxe, talvez pelas cegonhas que vejo ao largo olhar. Usufruo desta dor e absorvo-a como reflexão. Não ouso sequer estender a mão para um cigarro, ou tirar o isqueiro de fogo, garanti que ficaria assim até que a vida me queira viver, ou que eu suporte vivê-la.
Apetece-me indiscutivelmente banhar-me em lágrimas, mas este insuportável cansaço inunda-me interiormente e, com um egoísmo mecânico profundo, nem me põem água na retina.
Inspiro dor, tudo o que há em mim é puramente dor, gotejo dor, dor ancestral.
Prometi que não pensaria; se pensaram que pensei, não me digam… deixem-se a sós com a dor, precisamos de conversar…


terça-feira, 30 de outubro de 2012

Cigarro à Luar


Tenho desejo de um cigarro. Aliás, quero um cigarro; sentir a sua fragilidade; vê-lo a consumir-se, enquanto me consome, e estender o olhar afeado por esta miragem citadina; tomar o seu paladar infimamente e particularizar o seu esvair precoce entre a sensação dos dedos. Deixar-me abrangido pela quentura das paredes e emocionar-me com o cair da chuva. Debruçar o meu corpo sobre o vago (cigarro ardente), sentir a leveza das partículas, atraiçoar o pensamento, trair o destino, apunhalar a vida!
Fumar mata? E viver? Viver também não é mortal (confusão) – dilema?! Oh, como é constrangedor estar vivo.
Sou um louco insanável que se tenta preencher por uma razão, que jamais será absoluta, pelo seu próprio conceito ser privado e relativo.
Experimento a combustão do corpo, a química capaz de nutrir os poros, de dar gesto ao homem – expressão. Se ao menos tudo fosse exacto e não houvesse este luar perfumado de Outono. Se pelo menos fosse poeta e tivesse a capacidade de me enjugar neste papel e ver-me esvaído de mim. A minha complexidade cansa-me de verdade, enquanto o cigarro se dissipa…
Apago o cigarro.
Deito-me.
Finjo que não respiro.


Sociedade Crua

sexta-feira, 11 de maio de 2012

De Olhos Virados ao Passado


Teremos um dia a ousadia de visitar o passado, de aguentar o reencontro em que nada pode ser mudado? Talvez aí tenhamos a consciência, ultrapassada, da inutilidade humana, deste planeta viscosamente imbecil.
Hoje somos preenchidos por tudo e completos por nada. Não são materiais as carências humanas, estão além disso. Escasseiam os valores; deitados ao abandono, adormeceram no passado!
Encontro-me asfixiado pela necessidade que, eventualmente, há um “além” disto, um exemplo, eventualmente, de uma pró-pessoa actual. 
Provetura num futuro próxomo diremos "eu era/fiz aquilo?".




Rui Veloso - Cavaleiro Andante



Porque sou o cavaleiro andante
Que mora no teu livro de aventuras
Podes vir chorar no meu peito
As mágoas e as desventuras

Sempre que o vento te ralhe
E a chuva de maio te molhe
Sempre que o teu barco encalhe
E a vida passe e não te olhe

Porque sou o cavaleiro andante
Que o teu velho medo inventou
Podes vir chorar no meu peito
Pois sabes sempre onde estou

Sempre que a rádio diga
Que a américa roubou a lua
Ou que um louco te persiga
E te chame nomes na rua

Porque sou o que chega e conta
Mentiras que te fazem feliz
E tu vibras com histórias
De viagens que eu nunca fiz

Podes vir chorar no meu peito
Longe de tudo o que é mau
Que eu vou estar sempre ao teu lado
No meu cavalo de pau

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Corpos


O silêncio cai sobre a noite envergonhada e pulveriza os corpos com o odor intenso das vontades; as cortinas de linho deixam antever, no entretanto dos seus tecidos, este peculiar cair da noite.Da visão que separa sonhos e realidades, estão corpos nus. Vibram com o brotar das emoções, deslizam entre o físico ardente e o perceptível encarnar do sangue que flutua nas mãos carregadas do possuir.
A respiração vê-se seduzida pela quentura dos corpos, pelo escarne do divinal pecado.
Suspendem-se no “glamour” deste felino olhar que emana do silêncio, que quebra e enfeitiça os corpos, que cuspe fogo e deixam-se murmúrios de si…  


terça-feira, 8 de maio de 2012

Luz em Contrastes


Ainda que timidamente, o sol espreita aqui e ali. Sorri, irónico, e enrola-se de novo com as nuvens. Escuro…
E vai assim alternado entre o claro e o escuro, neste jogo de sombras, de contrastes. Mas ele nasce sempre, e amanhã, amanhã(?), amanhã é um novo dia, talvez com sombras no entretanto, mas ele nascerá de novo, porque ele nasce sempre!


segunda-feira, 7 de maio de 2012

"Mãe" - Miguel Torga

Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito.
Presença cinzelada em pedra dura,
Que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti — não me respondes.
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio.

Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim! 

Miguel Torga